19 fevereiro, 2006

Declínio e Queda do Beijo Ocidental


É curioso o fenômeno do beijo (na boca) atual. A obsolescência do termo beijo para descrever esse típico cumprimento dos casais de hoje deve ficar evidente ao observarmos os outros tipos de beijo: ninguém abre a boca, numa tentativa desesperada de - é o que me parece - abarcar o crânio de um indivíduo ao dar-lhe um beijo no rosto. Similarmente, não costumamos tentar lamber e engolir os dedos de cuja mão estamos a beijar, pelo menos quando estamos em público. De tal maneira que o beijo na boca, na acepção atual, é um adorno social dos mais peculiares, para não dizer dos mais estarrecedores.

Trata-se de prática bastante difundida; as pessoas já andam com a boca entreaberta, com filetes de saliva a escorrer pelos cantos; sedentos. A língua já perdeu toda sua privacidade, de vez que raramente se encontra dentro da boca. Não deixa de ser divertido observar casais que, plenamente conscientes da singularidade do ritual do beijo, refestelam-se da melhor maneira possível numa parede qualquer e, com um ar altivo de quem está fazendo um grande bem a humanidade, dão início a um processo de transferência de fluidos que só vem a ter fim quando não se sabe mais de quem é cada língua.

Pergunto a mim mesmo se o beijo tradicional foi dispensado por um processo de eliminação crítica ou por mero desconhecimento de sua existência. Ciente de que a segunda opção está mais próxima da realidade, antecipo-me e mando uma foto de James Stewart com Grace Kelly, os quais, apesar de não arriscarem um deslocamento de mandíbula durante o beijo, não parecem menos satisfeitos.