30 janeiro, 2006

O Problema da Ciclóide


Cognominada a "Helena dos Geômetras" por ter causado muita discussão durante o século XVII, eis que surge a ciclóide, já "domada", na forma de um desafio proposto, em 1696, pelo matemático suíço Johann I Bernoulli (1667-1748) (porque houve também um Johann II Bernoulli). O desafio consistia em determinar a curva sobre a qual uma massa pontual deslizaria, partindo do repouso e acelerada apenas pela gravidade (desconsidera-se o atrito), de um ponto para outro ponto situado num nível abaixo do primeiro no menor tempo possível.
I, Johann Bernoulli, address the most brilliant mathematicians in the world. Nothing is more attractive to intelligent people than an honest, challenging problem, whose possible solution will bestow fame and remain as a lasting monument. Following the example set by Pascal, Fermat, etc., I hope to gain the gratitude of the whole scientific community by placing before the finest mathematicians of our time a problem which will test their methods and the strength of their intellect. If someone communicates to me the solution of the proposed problem, I shall publicly declare him worthy of praise.
A solução, já então conhecida por Bernoulli, é um segmento cicloidal.

Em 1638 Galileo já havia estudado o problema e chegado a uma conclusão incorreta: segundo ele, a solução para o problema da braquistócrona (do grego brachistos, menor; chronos, tempo) seria um arco de circunferência. Leibniz, L'Hospital, os irmãos Bernoulli (Johann e Jakob) e Newton, chegaram, todos eles, a soluções corretas, sendo que, segundo consta, Newton teria publicado sua solução, anonimamente, um dia após o desafio ter sido feito. Apesar do anonimato, Bernoulli reconheceu logo que se tratava de Newton: segundo o suíço, era a solução mais "elegante e engenhosa." Realmente, a solução não é das mais complicadas se usarmos o cálculo, à epoca quase que propriedade exclusiva de Newton e Leibniz. Bernoulli, por exemplo, resolveria o problema usando uma situação análoga: um raio de luz atravessando meios transparentes com índices de refringência crescentes ou decrescentes.

O mais impressionante sobre a ciclóide é a riqueza de propriedades (a de braquistócrona é apenas uma delas), algumas delas tão 'fortes' que aparentam ser, em primeira análise, uma extrema coincidência. O particular que viria a chamar a atenção de Herman Melville é o da tautocronia, como atesta a seguinte passagem do seu Moby Dick:
[The try-pot] is also a place for profound mathematical meditation. It was in the left-hand try-pot of the Pequod, with the soapstone diligently circling round me, that I was first indirectly struck by the remarkable fact, that in geometry all bodies gliding along a cycloid, my soapstone, for example, will descend from any point in precisely the same time."
Essa propriedade, descoberta pelo físico holandês Christiaan Huygens (1629-1695) (o mesmo da teoria ondulatória da luz) e publicada em seu Horologium oscillatorium de 1673, garante o que é descrito, em relação ao seu sabonete, por Melville: não importa se largamos um objeto da extremidade superior da curva ou um de um ponto com metade da altura; em ambos os casos, o objeto chegará no ponto mais baixo da trajetória depois de um mesmo intervalo de tempo. Mesmo depois de tanto tempo, a Helena dos geômetras ainda tem seu charme.