08 março, 2006

Engels Pergunta...

É sabido que, enquanto Marx ficava responsável pela elaboração teórica do socialismo científico alemão, a Engels cabia, nos periódicos de então, rebater as idéias que se opusessem à teoria marxista. Isso se deu inclusive após a morte de Marx, como é o caso de dois artigos que Engels escreveu em resposta às invectivas de um proudhoniano alemão, concernentes ao problema da moradia do trabalhador industrial.

Em dado momento, claramente perturbado com a possibilidade da existência de uma justiça eterna que, segundo Proudhon, deveria reger todo o processo revolucionário, Engels admite:
Esta "idea de justicia de la revolución" es para mí un enigma. Cierto que Proudhon hace de "la revolución" una especie de divindad que encarna y cumple su "justicia", pero (...)
E, mais adiante, pergunta:
Hemos oído hablar de personas que están "en el cristianismo, en la fe verdadera, en gracia de Dios," etc. Pero ¿"estar" en la revolución, el más agitado de los movimientos? ¿Es que "la revolución" es una religión dogmática en la que haya que creer?
E, no final das contas, Marx e Engels padecem do mesmo mal que tanto condenam: criaram um dogma. É o que observa Edmund Wilson em seu To The Finland Station. Tentaram criar a ciência do comportamento humano, a ciência da própria realidade, isto é, a divindade em seu estado mais completo. Engels adverte que representa um exercício por demais subjetivo querer saber como o proletariado resolverá o problema da moradia: se por uma desapropriação imediata ou gradativa das residências de classe superior. Em outras palavras: melhor deixar a discussão para depois da revolução. Que nunca veio.

Lewis Mumford, no mesmo livro que comentei há alguns dias, mostra que mesmo numa conjuntura revolucionária a idéia da desapropriação redundaria ineficaz:
Noutras palavras, até mesmo aquele crítico revolucionário não se dava conta do fato de que as moradias de classe superior eram, mais frequentemente do que se imagina, intoleráveis supercortiços. A necessidade de aumentar as disponibilidades de habitação, de expandir o espaço, de multiplicar o equipamento, de proporcionar facilidade comunais, era muito mais revolucionária nas suas exigências do que haveria de ser qualquer tola desapropriação das residências ocupadas pelos ricos. Esta última noção nada mais foi que um gesto impotente de vingança: a primeira exigia uma completa reconstrução de todo o ambiente social - uma reconstrução como esta em cujo limiar o mundo talvez se encontre hoje em dia, embora até mesmo países adiantados como a Inglaterra, a Suécia e os Países Baixos não tenham ainda apreendido todas as dimensões dessa mudança urbana.
Engels pergunta e, em tempo, obtém sua resposta.