05 maio, 2007

Documentário: Nadie Escuchaba

"Ninguém escutou" é o típico apelo do teórico da conspiração. Não é à toa que muitos ainda encaram a revolução cubana exatamente assim, como uma grande teoria da conspiração. Quando muito, admitem que houve algo de errado, deixando claro que os abusos não excedem o que se observa numa ditadurazinha qualquer. Chegará o dia em que tudo ficará claro (para quem quer, já chegou) e as justificativas terão de ser 'levemente' alteradas.

O que há de mais interessante no Nadie escuchaba, e não sei bem se é intencional, é o discurso incrédulo de alguns ex-revolucionários, hoje contra-revolucionários. A incredulidade permanece mesmo depois de 10, 15, 20 ou até 25 anos de prisão. São todos intelectuais, na acepção do termo que já discutimos aqui. Perguntam-se candidamente por que o PC russo, de que eram seguidores fiéis, não veio lhes socorrer enquanto estavam encarcerados. Creditam a desgraceira em que se tornou a revolução a um acidente de percurso, um detalhe que poderia muito bem ser evitado. Daí a incredulidade: não conseguem entender por que tiveram de sofrer por tanto tempo, já que tudo que fizeram foi discordar em algum detalhe com a alta nomenklatura do partido. Repete-se aqui, com uma homogeneidade quase monótona, o que já sabíamos da 'corte' stalinista: companheiros prendendo companheiros. Sob pena de irem também eles para o xadrez (ou coisa pior) caso mostrem alguma relutância.

O fascínio que os ideais revolucionários exerce nessa gente não se apagou mesmo depois de tantos anos. Podemos pensar num sentimentalismo inarredável (é o que Hayek sugere) para explicar tanta insistência. O mesmo ocorre com os intelectuais que assistem de fora... a lista é interminável. Foucault acompanhou com entusiasmo a experiência iraniana; Garcia Marquez e Saramago nada vêem de errado em Fidel, assim como Susan Sontag não via; Edmund Wilson não escondia sua admiração por Lenin, Hemingway tampouco; H. G. Wells e Bernard Shaw, a princípio, não viam risco algum na figura de Hitler; Harold Laski e E. H. Carr chegaram a elogiar entusiasticamente a URSS stalinista. Consumada a catástrofe, transferem suas esperanças para outra experiência macabra. Cuba foi, por muito tempo, a menina dos olhos de vários intelectuais desiludidos com as experiências soviética e chinesa. Não aprenderam nada.