- Macho: caralho, macho! Toca essa bola!
Chego a um campo de terra batida, na praia do futuro. O pessoal que está de fora nem me cumprimenta (os que estão jogando muito menos) apesar de todos me conhecerem. Vão logo dizendo que vou ter de tirar par ou ímpar com o outro sujeito que acaba de chegar; eles vão jogar, chegaram há mais tempo. O sujeito que chegou comigo não aceita, argumenta que os outros já jogaram hoje e que por isso devem ceder a vez. Muita discussão e xingamentos. Chega-se a um acordo quando a partida anterior já tinha acabado há mais de cinco minutos; os que vão saindo do campo incrementam a gritaria.
- Porra, começa logo isso!
Não começam porque há discussão pra ver quem começa com a bola. O goleiro do time adversário avisa que nosso time está completamente irregular; é forte demais. Possidônio e Carlinhos (vulgo "Carlin") no mesmo time é palhaçada. Avisa ainda que eles devem começar com a bola porque estão sem camisa. Eu interrompo e digo que, sendo esse o problema, nós poderíamos tirar as nossas. Erro fatal: eles têm precedência porque tiraram primeiro. No mundo particular do futebol, quem faz algo primeiro adquire uma autoridade tacitamente interdita.
- Manda aquele filho da puta ligar o resto das luzes! Tá todo mundo pagando!
Um moleque de uns 12 anos tinha ido na chave de força e apagado algumas luzes, provavelmente a mando do dono, pra economizar energia. Mal o jogo começa e já estão discutindo porque o nosso goleiro pegou um recuo de bola com a mão. "Arriégua, isso aqui agora é a Fifa, é?", mas não tem jeito: o Jorginho, do outro time, gosta de seguir as regras à risca. Enquanto isso o Joaquim, notório encrenqueiro, começa a insultar, de fora do campo, a mãe de um de nossos atacantes:
- Ei, Mário, como é mesmo que a mãe do Dudu ri? Ah, ah, ah? Muito escrota aquela velha...
Nosso time faz um gol e a partida tem de ser interrompida por mais uns cinco minutos porque ninguém se candidata a substituir o goleiro. "Eu avisei que era o último a ir pro gol", "Avisou porra nenhuma", "Aproveita e vai tu, é bom que não atrapalha o time". O pessoal que está de fora começa a ficar indócil e a avisar que os dez minutos já se passaram. Olho pro meu relógio e vejo que ainda faltam três. O jogo termina empatado e surge novo desentendimento: saem os dois times ou batemos pênaltis?
- Macho, esse pessoal não se entende nunca.
Hora de ir embora. Juvenal vai logo avisando que não vai pagar porque só jogou duas partidas: "Não joguei quase nada!", "Quem manda ser ruim? São só 4 reais...", "Só tenho dois". Juvenal abre a carteira e faz um esforço danado pra esconder a nota de dez reais. Mais cinco minutos de convencimento e ele aceita pagar o resto: "Nem tinha visto esse dinheiro aqui...". O pessoal começa a se afastar. Alguns conhecidos, que não me viam há anos, percebem minha presença e acenam com a cabeça. Mas a regra é evitar cumprimentos desnecessários.
- Eu não vou apagar essa luz! O último a sair que apague.
Chego a um campo de terra batida, na praia do futuro. O pessoal que está de fora nem me cumprimenta (os que estão jogando muito menos) apesar de todos me conhecerem. Vão logo dizendo que vou ter de tirar par ou ímpar com o outro sujeito que acaba de chegar; eles vão jogar, chegaram há mais tempo. O sujeito que chegou comigo não aceita, argumenta que os outros já jogaram hoje e que por isso devem ceder a vez. Muita discussão e xingamentos. Chega-se a um acordo quando a partida anterior já tinha acabado há mais de cinco minutos; os que vão saindo do campo incrementam a gritaria.
- Porra, começa logo isso!
Não começam porque há discussão pra ver quem começa com a bola. O goleiro do time adversário avisa que nosso time está completamente irregular; é forte demais. Possidônio e Carlinhos (vulgo "Carlin") no mesmo time é palhaçada. Avisa ainda que eles devem começar com a bola porque estão sem camisa. Eu interrompo e digo que, sendo esse o problema, nós poderíamos tirar as nossas. Erro fatal: eles têm precedência porque tiraram primeiro. No mundo particular do futebol, quem faz algo primeiro adquire uma autoridade tacitamente interdita.
- Manda aquele filho da puta ligar o resto das luzes! Tá todo mundo pagando!
Um moleque de uns 12 anos tinha ido na chave de força e apagado algumas luzes, provavelmente a mando do dono, pra economizar energia. Mal o jogo começa e já estão discutindo porque o nosso goleiro pegou um recuo de bola com a mão. "Arriégua, isso aqui agora é a Fifa, é?", mas não tem jeito: o Jorginho, do outro time, gosta de seguir as regras à risca. Enquanto isso o Joaquim, notório encrenqueiro, começa a insultar, de fora do campo, a mãe de um de nossos atacantes:
- Ei, Mário, como é mesmo que a mãe do Dudu ri? Ah, ah, ah? Muito escrota aquela velha...
Nosso time faz um gol e a partida tem de ser interrompida por mais uns cinco minutos porque ninguém se candidata a substituir o goleiro. "Eu avisei que era o último a ir pro gol", "Avisou porra nenhuma", "Aproveita e vai tu, é bom que não atrapalha o time". O pessoal que está de fora começa a ficar indócil e a avisar que os dez minutos já se passaram. Olho pro meu relógio e vejo que ainda faltam três. O jogo termina empatado e surge novo desentendimento: saem os dois times ou batemos pênaltis?
- Macho, esse pessoal não se entende nunca.
Hora de ir embora. Juvenal vai logo avisando que não vai pagar porque só jogou duas partidas: "Não joguei quase nada!", "Quem manda ser ruim? São só 4 reais...", "Só tenho dois". Juvenal abre a carteira e faz um esforço danado pra esconder a nota de dez reais. Mais cinco minutos de convencimento e ele aceita pagar o resto: "Nem tinha visto esse dinheiro aqui...". O pessoal começa a se afastar. Alguns conhecidos, que não me viam há anos, percebem minha presença e acenam com a cabeça. Mas a regra é evitar cumprimentos desnecessários.
- Eu não vou apagar essa luz! O último a sair que apague.
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