O que seria de nós se não existissem os com-iniciativa? Não passa um dia sem que eu interrompa, por um ou dois minutos, meus afazeres, agradecendo mentalmente e com grande reverência o trabalho vertiginoso desses virtuosos. Provavelmente não está claro o que quero dizer com 'com-iniciativa': o sujeito com-iniciativa é aquele que, quando anunciam uma festinha qualquer, se disponibiliza, arfando e aos tropeços, para ajudar na organização. Aquele que, se há uma rifa, faz de tudo pra conseguir ajudar na vendagem dos bilhetes.
É claro que a mesquinhez dos exemplos citados é intencional, mas já dá pra ter uma idéia do que quero dizer. Hoje não se pode passar uma esquina sem ouvir algum suposto especialista esbravejando aos quatro ventos: 'precisa-se de iniciativa e de proatividade. Flexibilidade também'. Quem precisa? 'O mercado de trabalho'. Sinceramente espero que essa entidade mística e flutuante, o tal mercado de trabalho, já esteja abarrotada de gente com iniciativa. Será mais fácil manter a distância. E ainda assim agradeço-lhes a existência? Pois sim.
Imagino que seria particularmente difícil sobreviver sem que eles existissem; seria necessário divisar uma maneira alternativa para encontrar os vendedores de bilhetes. Sorteio ou algo do tipo. O certo é que representa esforço hercúleo tentar substituir essa gente; eles são infatigáveis, eles não páram, e eles adoram dizer que não páram. Eles estão sempre juntos: sentem uma necessidade inadiável de se reunir, de debater, de discutir o inominável e de descrever o inefável. Seria o caso de apelar para ferramentas psicanalíticas se eu tivesse competência para tanto. Penso logo em Estragon, personagem da peça Waiting for Godot de Samuel Beckett, aquele mesmo que enchia e esvaziava garrafas sucessivamente para passar o tempo. A diferença é que Estragon sabia que era inútil continuar, apesar de nunca lhe ter passado pela cabeça não continuar.
Falava eu da mania que eles têm de se reunir. Já se transformou em verdadeiro fetiche: reúnem-se para discutir os altíssimos desígnios que lhes foram incumbidos pela iniciativa e pela proatividade. Amiúde chegam à conclusão de que o mundo é verdadeiramente mau e de que é necessário transformá-lo dum só golpe, apesar de eu nunca ter testemunhado, por parte deles, a mais modesta tentativa de compreendê-lo. Não sei que maluco resolveu convencê-los de que têm autoridade ou capacidade para tanto. O certo é que, armados até os dentes com uma filantropia tão burra quanto engraçada, promovem um estrago que requintes de artificiosa deliberação talvez não igualassem.
Já me arrependi: melhor não agradecer.
É claro que a mesquinhez dos exemplos citados é intencional, mas já dá pra ter uma idéia do que quero dizer. Hoje não se pode passar uma esquina sem ouvir algum suposto especialista esbravejando aos quatro ventos: 'precisa-se de iniciativa e de proatividade. Flexibilidade também'. Quem precisa? 'O mercado de trabalho'. Sinceramente espero que essa entidade mística e flutuante, o tal mercado de trabalho, já esteja abarrotada de gente com iniciativa. Será mais fácil manter a distância. E ainda assim agradeço-lhes a existência? Pois sim.
Imagino que seria particularmente difícil sobreviver sem que eles existissem; seria necessário divisar uma maneira alternativa para encontrar os vendedores de bilhetes. Sorteio ou algo do tipo. O certo é que representa esforço hercúleo tentar substituir essa gente; eles são infatigáveis, eles não páram, e eles adoram dizer que não páram. Eles estão sempre juntos: sentem uma necessidade inadiável de se reunir, de debater, de discutir o inominável e de descrever o inefável. Seria o caso de apelar para ferramentas psicanalíticas se eu tivesse competência para tanto. Penso logo em Estragon, personagem da peça Waiting for Godot de Samuel Beckett, aquele mesmo que enchia e esvaziava garrafas sucessivamente para passar o tempo. A diferença é que Estragon sabia que era inútil continuar, apesar de nunca lhe ter passado pela cabeça não continuar.
Falava eu da mania que eles têm de se reunir. Já se transformou em verdadeiro fetiche: reúnem-se para discutir os altíssimos desígnios que lhes foram incumbidos pela iniciativa e pela proatividade. Amiúde chegam à conclusão de que o mundo é verdadeiramente mau e de que é necessário transformá-lo dum só golpe, apesar de eu nunca ter testemunhado, por parte deles, a mais modesta tentativa de compreendê-lo. Não sei que maluco resolveu convencê-los de que têm autoridade ou capacidade para tanto. O certo é que, armados até os dentes com uma filantropia tão burra quanto engraçada, promovem um estrago que requintes de artificiosa deliberação talvez não igualassem.
Já me arrependi: melhor não agradecer.
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