26 maio, 2006

Brasil vs. Brasil

O tenente-coronel da FAB Marcos Pontes - o brasileiro que custou ao governo brasileiro US$ 10 milhões para ir ao espaço e plantar um fofíssimo pé-de-feijão - resolveu visitar o ITA, onde se formou em Engenharia Aeronáutica há 12 anos, para falar aos alunos da graduação e a algumas autoridades militares. Foi laureado com uma placa, que lhe foi entregue por um aluno do 2° ano fundamental, em que se lê: "Uma homenagem e o reconhecimento ao iteano da Turma 93 (Engenharia Aeronáutica), primeiro Astronauta Brasileiro, pelo grandioso feito de elevar ainda mais alto a bandeira do Brasil." É realmente lamentável que o astronauta não tenha podido, como o fez Santos Dumont, custear suas próprias extravagâncias: felizmente, há o contribuinte para substitui-lo nessa incumbência.

O atual diretor do CTA (Centro Técnico Aeroespacial, órgão ao qual o ITA é subordinado), asseverou que não entende a insatisfação gerada pelo desperdício, visto que "o caso do mensalão foi pior que o do astronauta." Se tudo que for 'melhor' que o mensalão passar a ser permitido (quiçá louvável), estaremos dando permissão para o brasileiro viver numa sempiterna patifaria. Não que ele precise dessa permissão, é claro; apenas observo que a coonestação vinda de cima é um emblema do nosso tempo.

A própria palestra do austronauta deixa transparecer uma característica intrinsecamente brasileira: a volúpia da ladinice. Pontes fez questão de salientar os "truques" e os "atalhos" de que lançou mão para obter sucesso na fase de preparação. Gostaria de deixar claro, desde já, que se trata de sujeito simpático e que não duvido de suas qualificações profissionais; ainda assim, não deixa de ser curioso que ele tenha sentido a necessidade de repetir a velha retórica da "lei do menor esforço" (para o delírio da platéia). No ambiente acadêmico é a mesma coisa: mais respeitável não é aquele que obtém os melhores resultados, mas sim o que não se esforça e ainda assim angaria resultados razoáveis. Qualquer esforço sistemático e desinteressado é sinônimo de alienação e motivo para chacotas. O mundo é dos espertos.

Marcos Pontes foi esperto. Transformou-se em herói nacional do dia para a noite, papeou em tempo real com o presidente Lula (vide matéria na Primeira Leitura de maio) e dá palestras (em que conta algumas anedotas desinteressantes e sucumbe à idiotia pseudonacionalista) por pequenas fortunas apiece. Muito bem. Ainda assim, duvido que chegue aos dez milhões.