Eu andava com idéias de escrever sobre o mau português que se fala no Brasil quando chegou até mim uma entrevista que o Napoleão Mendes de Almeida, o afamado gramático, concedeu à Veja em 1993 (leia aqui). Nela ele diz que a TV talvez seja o maior difusor do português torto que conhecemos tão bem. Fato é que, hoje, a TV já não pode fazer muita coisa: falar em português correto é mais constrangedor que gaguejar ou lançar generosos perdigotos por aí.
Vi ontem um episódio da série Capitu, baseada no Dom Casmurro de Machado. Os diálogos simplesmente não soam naturais, assim como não soam naturais os diálogos de todas as outras obras baseadas em livros do Machado, ou em qualquer outro livro da época. Todas essas adaptações estão fadadas ao fracasso imediato porque o brasileiro admite como absurda a possibilidade de ouvir um discurso com pronomes devidamente posicionados. Mas e daí, fazer o quê? A culpa é dos atores que se esforçaram (imagina-se o quanto) pra decorar as linhas?
O problema é que o abismo entre o português falado e o escrito é, mesmo hoje, intransponível. Tome o mais idiota dos adolescentes norte-americanos e ficará claro que o inglês falado (incluindo os usuais abusos: like, you know...) não está tão distante do inglês acadêmico. A estrutura das frases ao menos é a mesma; os solecismos mais comuns, os de ortografia, são obviamente imperceptíveis na linguagem oral. Já ao falante brasileiro ficam proibidas construções tão banais quanto 'eu a vi' ou 'segurei-lhe a mão', sob pena de um olhar mais ou menos enviesado.
Enquanto no inglês identifica-se a linguagem formal principalmente pela riqueza vocabular e pela correção ortográfica, identifica-se o mesmo em português por construções meramente corretas. Mesóclise, então, nem pensar, apesar de ser bem sabido que ela é às vezes insubstituível (não fosse, gente como Graciliano Ramos não a usaria). Regência correta de termos menos recorrentes já é luxo descabido, demonstração quase certa de arrogância.
E é assim que os personagens de nosso maior escritor (quando aparecem fora de seus livros) não nos parecem apenas diferentes, como seria natural esperar de gente que morreu há mais de um século, e que é como os personagens de Dickens ou Conrad devem parecer ao inglês hodierno. Eles nem sequer parecem brasileiros e, se realmente o foram, o certo é que há uma grande catástrofe nos separando.
Vi ontem um episódio da série Capitu, baseada no Dom Casmurro de Machado. Os diálogos simplesmente não soam naturais, assim como não soam naturais os diálogos de todas as outras obras baseadas em livros do Machado, ou em qualquer outro livro da época. Todas essas adaptações estão fadadas ao fracasso imediato porque o brasileiro admite como absurda a possibilidade de ouvir um discurso com pronomes devidamente posicionados. Mas e daí, fazer o quê? A culpa é dos atores que se esforçaram (imagina-se o quanto) pra decorar as linhas?
O problema é que o abismo entre o português falado e o escrito é, mesmo hoje, intransponível. Tome o mais idiota dos adolescentes norte-americanos e ficará claro que o inglês falado (incluindo os usuais abusos: like, you know...) não está tão distante do inglês acadêmico. A estrutura das frases ao menos é a mesma; os solecismos mais comuns, os de ortografia, são obviamente imperceptíveis na linguagem oral. Já ao falante brasileiro ficam proibidas construções tão banais quanto 'eu a vi' ou 'segurei-lhe a mão', sob pena de um olhar mais ou menos enviesado.
Enquanto no inglês identifica-se a linguagem formal principalmente pela riqueza vocabular e pela correção ortográfica, identifica-se o mesmo em português por construções meramente corretas. Mesóclise, então, nem pensar, apesar de ser bem sabido que ela é às vezes insubstituível (não fosse, gente como Graciliano Ramos não a usaria). Regência correta de termos menos recorrentes já é luxo descabido, demonstração quase certa de arrogância.
E é assim que os personagens de nosso maior escritor (quando aparecem fora de seus livros) não nos parecem apenas diferentes, como seria natural esperar de gente que morreu há mais de um século, e que é como os personagens de Dickens ou Conrad devem parecer ao inglês hodierno. Eles nem sequer parecem brasileiros e, se realmente o foram, o certo é que há uma grande catástrofe nos separando.
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