Façam-me o favor de ler essa crônica do Ruy Vasconcelos sobre o atendimento nos bares de Fortaleza: Cultivados grãos de um sadismo datado. Não precisa agradecer. O texto tem significado especial pra mim porque o péssimo serviço dos garçons fortalezenses sempre me pareceu um grande mistério. Como o próprio Ruy lembra, nós fortalezenses somos tidos como simpáticos e hospitaleiros. Mais intrigante ainda: os vários garçons cearenses que encontro em São Paulo são excelentes, exemplos de simpatia e hospitalidade. O que poderia ter ocorrido? Só fui descobrir agora porque era novo demais pra frequentar bares no começo da década de 90, mas bem que devia ter desconfiado.
Ontem mesmo fui a um dos bares-restaurante mais reputados de Fortaleza, desses que aparecem nas listinhas da revista Veja. Um garçom passou apressado e derrubou minha cerveja quase inteira. Trocou a toalha e, para o meu espanto, nada de trazer uma cerveja nova. Chamei o chefe (aquele mais arrumadinho) e perguntei por que não traziam outra. Resposta: eu devia ter falado com ele antes. Em bares fortalezenses, você está sempre errado.
Por muito tempo procurei palavras para descrever a postura desses luminares do atendimento. Ruy acerta na mosca: agem com 'desfaçatez e calculado cinismo'. Quando chamados, fingem que não ouvem e apressam o passo; há um apelo urgente vindo da cozinha ou de um cliente perdido no horizonte. Se um casal pede comida do restaurante, um dos dois tem de ser servido primeiro; passado tempo suficiente para que ele dê cabo ao lanche, chega o pedido do outro. A bebida, para a decepção geral dos sádicos, não é mais servida quente graças aos avanços galopantes da engenharia.
Já escrevi três parágrafos e ainda não dei um jeito de meter os EUA no meio! Faço-o agora: o atendimento lá é sempre bom porque os garçons trabalham com gorjeta (Ruy fala em boas gorjetas no Estoril; se não se tratar de truque retórico confesso-me desiludido). Alguém pode lembrar que temos os famosos 10%, mas no Brasil não se trabalha pelo que não se pode perder. Em São Paulo a gorjeta não é incomum, embora ainda se confunda um pouco com uma espécie de suborno amigável. O cliente suborna o garçom (especialmente se tiverem algo de grande relevância em comum, como o estado de origem ou o time do coração) e o garçom retribui com presteza e eventuais chopps gratuitos. Aqui não há diálogo; o garçom está sempre preocupado com espectros que lhe sugam a presença.
A verdade aparente é que o bom garçom está sempre querendo deixar de ser garçom (no caso dos EUA) ou pelo menos ficar menos pobre. É o bom e velho Capital operando suas maravilhas. Não vejo por que isso deve ser incompatível com relações mais cordiais na mesa do bar. É bem verdade que o fortalezense continua maciçamente esquerdista, mas a morbidez, pelo que pude perceber, já é coisa do passado. Precisamos importar garçons cearenses.
Ontem mesmo fui a um dos bares-restaurante mais reputados de Fortaleza, desses que aparecem nas listinhas da revista Veja. Um garçom passou apressado e derrubou minha cerveja quase inteira. Trocou a toalha e, para o meu espanto, nada de trazer uma cerveja nova. Chamei o chefe (aquele mais arrumadinho) e perguntei por que não traziam outra. Resposta: eu devia ter falado com ele antes. Em bares fortalezenses, você está sempre errado.
Por muito tempo procurei palavras para descrever a postura desses luminares do atendimento. Ruy acerta na mosca: agem com 'desfaçatez e calculado cinismo'. Quando chamados, fingem que não ouvem e apressam o passo; há um apelo urgente vindo da cozinha ou de um cliente perdido no horizonte. Se um casal pede comida do restaurante, um dos dois tem de ser servido primeiro; passado tempo suficiente para que ele dê cabo ao lanche, chega o pedido do outro. A bebida, para a decepção geral dos sádicos, não é mais servida quente graças aos avanços galopantes da engenharia.
Já escrevi três parágrafos e ainda não dei um jeito de meter os EUA no meio! Faço-o agora: o atendimento lá é sempre bom porque os garçons trabalham com gorjeta (Ruy fala em boas gorjetas no Estoril; se não se tratar de truque retórico confesso-me desiludido). Alguém pode lembrar que temos os famosos 10%, mas no Brasil não se trabalha pelo que não se pode perder. Em São Paulo a gorjeta não é incomum, embora ainda se confunda um pouco com uma espécie de suborno amigável. O cliente suborna o garçom (especialmente se tiverem algo de grande relevância em comum, como o estado de origem ou o time do coração) e o garçom retribui com presteza e eventuais chopps gratuitos. Aqui não há diálogo; o garçom está sempre preocupado com espectros que lhe sugam a presença.
A verdade aparente é que o bom garçom está sempre querendo deixar de ser garçom (no caso dos EUA) ou pelo menos ficar menos pobre. É o bom e velho Capital operando suas maravilhas. Não vejo por que isso deve ser incompatível com relações mais cordiais na mesa do bar. É bem verdade que o fortalezense continua maciçamente esquerdista, mas a morbidez, pelo que pude perceber, já é coisa do passado. Precisamos importar garçons cearenses.
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