20 agosto, 2006

Mill (1): On Liberty

The object of this Essay is to assert one very simple principle, as entitled to govern absolutely the dealings of society with the individual in the way of compulsion and control, whether the means used be physical force in the form of legal penalties, or the moral coercion of public opinion. That principle is, that the sole end for which mankind are warranted, individually or collectively, in interfering with the liberty of action of any of their number, is self-protection.
O objetivo de John Stuart Mill (1806-73) ao escrever esse que se tornou seu ensaio mais famoso, On Liberty, era estabelecer um critério que não somente regulasse as relações entre indivíduo e sociedade, mas que também fosse simples, isto é, um princípio cuja aplicação simples e direta fosse capaz de solucionar qualquer dúvida relativa à interferência do coletivo na esfera individual. Um projeto assim tão ambicioso, ainda que empreendido por uma inteligência prodigiosa como a de Mill, estava fadado a falhar.

Realmente, o que se observa é que o critério proposto por Mill nada tem de simples. Primeiro, ele supõe que cada indivíduo, quando restrito ao âmbito pessoal, aquele que não exerce influência direta sobre quem quer que seja além do próprio indivíduo, tem o direito de cultivar livremente suas idiossincrasias. Difícil precisar os limites dessa "esfera" íntima; há quem argumente que ela nem sequer existe, visto que, a menos que se trate de um recluso, qualquer ação sua pode vir a ter um impacto sobre alguém, ainda que esse impacto não seja mais que um bom ou mal exemplo.

Adiante: sabemos que a interferência do coletivo sobre o individual pode ser justificada com base no argumento de que, no caso em questão, essa interferência evitaria danos a terceiros. Acontece que a interferência pode ser ela própria mais danosa que os males supostamente evitados. É-nos facilmente concebível uma situação em que o estímulo às liberdades pessoais de alguém (por exemplo, a liberdade de abrir um negócio) tem influência marcadamente negativa sobre as interesses de outros (por exemplo, da concorrência). Isso não significa que o Estado deve intervir, suprimindo ou limitando a liberdade de mercado. Se por acaso chegamos à conclusão de que, dada uma situação qualquer, algum tipo de intervenção faz-se necessária, é porque a força das circunstâncias nos fez ver que o mal advindo desse desrespeito à individualidade é mais que contrabalançado pelo benefício final alcançado.

Percebe-se logo que a aplicação desse princípio depende diretamente de longos processos de deliberação, em que devem pesar as especificidades de cada caso, e cujo fim é sempre a escolha, não raro dificílima, do mal menor. Esse é um problema intrínseco à filosofia utilitarista, sobre a qual Mill também escreve: se o objetivo maior de nossa existência é a Felicidade, como determinar os meios mais aconselháveis para a sua obtenção?, ou, questão análoga, como comparar diferentes prazeres? Vale lembrar que Mill vê o respeito à individualidade como condição necessária para se chegar à Felicidade (um dos capítulos do ensaio é chamado Of Individuality, as One of the Elements of Well-Being), motivo mais que suficiente para conferir especial seriedade à decisão de infringi-la.

Boa parte dessas dificuldades foram previstas e até comentadas pelo próprio Mill. Suas perguntas,
What, then, is the rightful limit to the sovereignty of the individual over himself? Where does the authority of society begin? How much of human life should be assigned to individuality, and how much to society?,
feliz ou infelizmente, continuam sem resposta definitiva. Mais uma vez, o pragmático triunfa sobre o paradigmático.