A primeira impressão que qualquer debate mais acirrado entre criacionistas e evolucionistas nos dá é a de que boa parte da discussão seria desnecessária se o cientista atual não fosse tão dado a extrapolações fáceis. A especialização exagerada, o recrudescimento das hostes dos 'especialistas sem coração' de Weber, faz com que muitos, numa tentativa heróica (e arrogante) de resguardar o ideal do homem renascentista, opinem a torto e a direito sobre assuntos com os quais têm pouca familiaridade. Ao mesmo tempo em que a especialização cresce, o especialista se revolta e pretende analisar tudo quanto lhe aparece pela frente com suas muito particulares anteninhas. Se a média dos darwinistas tivesse sido tão cuidadosa quanto o próprio Darwin, o estrago teria sido bem menor.
No Polemos - Um Análise Crítica do Darwinismo, José Oswaldo de Meira Penna (1917-) discute não o aspecto biológico, mas as consequências 'ideológicas, sociais, políticas e filosóficas' da obra de Darwin. O motivo é simples: são essas consequências o que realmente nos interessa, além de que a análise do aspecto estritamente biológico da coisa exigiria um conhecimento específico fora de nosso alcance. Enquanto a ratificação (ou não) da teoria biológica resultaria em apenas mais um enigma solucionado, sem muitas implicações diretas em nossas vidas, o molde ideológico que decorre de semelhante linha de raciocínio pode infestar, de maneira decisiva, as mais diversas áreas do conhecimento. Seria bobagem negar a idéia de evolução como um todo; há evidências arqueológicas suficientes para tornar a hipótese mais que plausível. Daí a aceitar a 'seleção natural', a seleção de mutações genéticas geradas, veja-se, ao acaso, há um longo caminho.
Deve-se perceber desde já a circularidade do 'enunciado' da seleção natural. Se enunciamos a seleção natural como a sobrevivência do mais apto, é natural surgir a pergunta: como verificar que os que sobreviveram são, de fato, os mais aptos? Ao que responderão: são os mais aptos porque, ora bolas, sobreviveram. Trocando um pouco as palavras, poderíamos igualmente ficar com um 'aquele que sobreviver sobreviverá'. A impossibilidade de 'testar' esse tipo de enunciado nos remete diretamente a Popper e a seu critério de falseabilidade, o qual, uma vez aceito, realmente destrói qualquer aspiração científica que o enunciado pudesse ter.
Pois mais que se reconheça e que se admire a idéia de evolução, ela parece incapaz de explicar dois momentos de particular interesse para qualquer mente especulativa: o da origem da vida, o surgimento da forma unicelular mais simples, e o do surgimento da 'consciência' humana, diretamente ligada a idéias de moral, ética, amor ou qualquer coisa comparavelmente complexa. O discurso darwinista pretende amenizar essa dificuldade lançando mão de vastos períodos de tempo, como se a lentidão do processo diminuísse suas complicações: 'é certo que o homem evoluiu do macaco, mas isso levou milhões e milhões de anos'. A intenção parece ser eximir-se de qualquer elucidação adicional, de vez que 'tudo' pode acontecer em milhões e milhões de anos. Ora, se eu tivesse que pintar um Rembrandt com a habilidade que tenho hoje, não vejo por que me sairia melhor se pudesse dar milhões e milhões de pinceladas infinitesimais.
Em relação ao segundo momento, lembramos que desde muito cedo Darwin sentiu-se compelido a enfiar a questão da moral na panacéia seletiva:
O livro de Meira Penna é dedicado ao biólogo norte-americano Edward Wilson, professor em Harvard. Wilson é um dos que pretendem explicar o sentimento altruísta a partir da seleção natural, e é ao comentar esse particular que Meira Penna desabafa: "Creio que Wilson, além de estudar biologia, deveria estudar um pouco a lógica de Aristóteles." E, infelizmente, a impressão que temos ao conhecer um pouco mais do pensamento de biológos da linha de Wilson, que reduzem toda a problemática humana a um zigzag genético, é a de que eles ignoram por completo esse tipo de raciocínio lógico:
No Polemos - Um Análise Crítica do Darwinismo, José Oswaldo de Meira Penna (1917-) discute não o aspecto biológico, mas as consequências 'ideológicas, sociais, políticas e filosóficas' da obra de Darwin. O motivo é simples: são essas consequências o que realmente nos interessa, além de que a análise do aspecto estritamente biológico da coisa exigiria um conhecimento específico fora de nosso alcance. Enquanto a ratificação (ou não) da teoria biológica resultaria em apenas mais um enigma solucionado, sem muitas implicações diretas em nossas vidas, o molde ideológico que decorre de semelhante linha de raciocínio pode infestar, de maneira decisiva, as mais diversas áreas do conhecimento. Seria bobagem negar a idéia de evolução como um todo; há evidências arqueológicas suficientes para tornar a hipótese mais que plausível. Daí a aceitar a 'seleção natural', a seleção de mutações genéticas geradas, veja-se, ao acaso, há um longo caminho.
Deve-se perceber desde já a circularidade do 'enunciado' da seleção natural. Se enunciamos a seleção natural como a sobrevivência do mais apto, é natural surgir a pergunta: como verificar que os que sobreviveram são, de fato, os mais aptos? Ao que responderão: são os mais aptos porque, ora bolas, sobreviveram. Trocando um pouco as palavras, poderíamos igualmente ficar com um 'aquele que sobreviver sobreviverá'. A impossibilidade de 'testar' esse tipo de enunciado nos remete diretamente a Popper e a seu critério de falseabilidade, o qual, uma vez aceito, realmente destrói qualquer aspiração científica que o enunciado pudesse ter.
Pois mais que se reconheça e que se admire a idéia de evolução, ela parece incapaz de explicar dois momentos de particular interesse para qualquer mente especulativa: o da origem da vida, o surgimento da forma unicelular mais simples, e o do surgimento da 'consciência' humana, diretamente ligada a idéias de moral, ética, amor ou qualquer coisa comparavelmente complexa. O discurso darwinista pretende amenizar essa dificuldade lançando mão de vastos períodos de tempo, como se a lentidão do processo diminuísse suas complicações: 'é certo que o homem evoluiu do macaco, mas isso levou milhões e milhões de anos'. A intenção parece ser eximir-se de qualquer elucidação adicional, de vez que 'tudo' pode acontecer em milhões e milhões de anos. Ora, se eu tivesse que pintar um Rembrandt com a habilidade que tenho hoje, não vejo por que me sairia melhor se pudesse dar milhões e milhões de pinceladas infinitesimais.
Em relação ao segundo momento, lembramos que desde muito cedo Darwin sentiu-se compelido a enfiar a questão da moral na panacéia seletiva:
Uma tribo, incluindo muitos membros que, por possuírem em alto grau o espírito de patriotismo, fidelidade, obediência, coragem e simpatia, sempre estivessem prontos para se ajudar mutuamente e se sacrificar para o bem comum, seria vitoriosa sobre a maior parte das outras tribos - e isso seria seleção natural. Em todas as épocas, no mundo, tribos sobrepujaram outras tribos; e como a moral é um elemento importante de seu sucesso, os padrões de moralidade e o número de homens bem aquinhoados assim tenderão por toda a parte a crescer e elevar-se.O trecho acima já parece contradizer a idéia corrente segundo a qual a seleção natural pressupõe um ambiente hostil de concorrência desenfreada e egoísta. Não é muito difícil imaginar uma situação em que considerações de ordem ética dificultam nossa própria sobrevivência: numa guerra, a restrição à morte de civis pode ser decisiva para o desfecho do conflito, enquanto que num outro lado, onde não há qualquer escrúpulo nesse sentido, o esforço de guerra poderá ser bem mais eficiente e finalmente vitorioso. Conclui-se sem muita dificuldade que a idéia de seleção natural é usada para explicar elementos mutuamente contraditórios: o egoísmo e o altruísmo, o escrúpulo moral e a barbárie.
O livro de Meira Penna é dedicado ao biólogo norte-americano Edward Wilson, professor em Harvard. Wilson é um dos que pretendem explicar o sentimento altruísta a partir da seleção natural, e é ao comentar esse particular que Meira Penna desabafa: "Creio que Wilson, além de estudar biologia, deveria estudar um pouco a lógica de Aristóteles." E, infelizmente, a impressão que temos ao conhecer um pouco mais do pensamento de biológos da linha de Wilson, que reduzem toda a problemática humana a um zigzag genético, é a de que eles ignoram por completo esse tipo de raciocínio lógico:
Falsa é a crença em verdades morais extrasomáticas e numa barreira absoluta entre o que é e o que deve ser. As premissas morais relacionam-se apenas com nossa natureza física e são o resultado de uma história genética idiossincrática.Como conclusão, respodemos afirmativamente à pergunta de Meira Penna:
A biologia não deveria, porventura, limitar-se à descrição do comportamento dos animais e das plantas, sem avançar em explicações antropocêntricas suscetíveis de se tornarem "irrefutáveis", no sentido de Popper, e, por conseguinte, não científicas? A teoria da evolução seria neste caso uma simples história da vida no planeta. O darwinismo seria uma história natural, simplesmente, e não uma teoria científica.
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