Uma pessoa (a menos que pobre) que não tem tempo pra fazer o que gosta é muito provavelmente idiota; uma pessoa que faz questão de dizer que não tem tempo pra fazer o que gosta é certamente idiota.
Se você franze o sobrolho quando um idiota diz, na sua frente, que não tem tempo pra fazer o que gosta, ele diz que na realidade (ou seja, antes estávamos no mundo dos sonhos, não na realidade) tem tempo de sobra pra fazer o que gosta porque gosta de tudo que faz. A intenção parece ser poder atirar pra todos os lados: aos que se querem mui importantes por estarem sempre ocupados, os idiotas se dizem também ocupados, sem tempo pra respirar e cansadíssimos; aos que preferem aproveitar a vida, os idiotas se dizem satisfeitos por passar todo o tempo fazendo algo que há minutos era estafante e insuportável.
Esses acessos de hiperatividade surgem, creio eu, de uma espécie de megalomania: a idéia de que estamos sempre a um passo de mudar o mundo. 'Mudar o mundo', 'fazer a diferença' etc. é uma questão de vontade, não de capacidade. Quando a turma do 'fazer a diferença' se reúne (e eles adoram se reunir), é para candidamente nos informar sobre a importância do tempo, sobre como 'otimizar' esforços, eliminar desperdícios, 'enxugar' a rotina etc., tudo, é claro, com aquele jargão corporativo-newage-bacaninha.
Tudo isso é muito curioso, principalmente porque não há lugar em que se perca mais tempo que nessas reuniões. Minha curiosidade mórbida me levou a verificar pessoalmente essa impressão que carrego desde o berço, quando começava a berrar e apertar veementemente um chocalho quando via um ongueiro distribuindo panfletos na praia. Visitem a página do Reunes (aqui) e vejam por quê. Observem a terminologia: 'empreendedorismo social', 'intercâmbio de idéias', 'poder transformador do jovem' e por aí vai. Dos palestrantes, nenhum seria capaz de definir esses termos sem se valer de outros mais abstratos ainda. Acho que um dos critérios mais seguros pra constatar o esvaziamento de uma idéia é constatar o esvaziamento da terminologia com que ela é expressa. Esses termos podem até ter tido significado palpável algum dia, mas hoje se reduziram a slogans polarizadores.
Reproduzo aqui o profile de um dos palestrantes, Edgard Gouveia Júnior:
Não parece razoável que toda uma geração se deixe levar por uma tergiversação de tão baixa qualidade. Se são esses os luminares que devem nos dizer o que fazer com nosso tempo, estaremos melhor dormindo.
Se você franze o sobrolho quando um idiota diz, na sua frente, que não tem tempo pra fazer o que gosta, ele diz que na realidade (ou seja, antes estávamos no mundo dos sonhos, não na realidade) tem tempo de sobra pra fazer o que gosta porque gosta de tudo que faz. A intenção parece ser poder atirar pra todos os lados: aos que se querem mui importantes por estarem sempre ocupados, os idiotas se dizem também ocupados, sem tempo pra respirar e cansadíssimos; aos que preferem aproveitar a vida, os idiotas se dizem satisfeitos por passar todo o tempo fazendo algo que há minutos era estafante e insuportável.
Esses acessos de hiperatividade surgem, creio eu, de uma espécie de megalomania: a idéia de que estamos sempre a um passo de mudar o mundo. 'Mudar o mundo', 'fazer a diferença' etc. é uma questão de vontade, não de capacidade. Quando a turma do 'fazer a diferença' se reúne (e eles adoram se reunir), é para candidamente nos informar sobre a importância do tempo, sobre como 'otimizar' esforços, eliminar desperdícios, 'enxugar' a rotina etc., tudo, é claro, com aquele jargão corporativo-newage-bacaninha.
Tudo isso é muito curioso, principalmente porque não há lugar em que se perca mais tempo que nessas reuniões. Minha curiosidade mórbida me levou a verificar pessoalmente essa impressão que carrego desde o berço, quando começava a berrar e apertar veementemente um chocalho quando via um ongueiro distribuindo panfletos na praia. Visitem a página do Reunes (aqui) e vejam por quê. Observem a terminologia: 'empreendedorismo social', 'intercâmbio de idéias', 'poder transformador do jovem' e por aí vai. Dos palestrantes, nenhum seria capaz de definir esses termos sem se valer de outros mais abstratos ainda. Acho que um dos critérios mais seguros pra constatar o esvaziamento de uma idéia é constatar o esvaziamento da terminologia com que ela é expressa. Esses termos podem até ter tido significado palpável algum dia, mas hoje se reduziram a slogans polarizadores.
Reproduzo aqui o profile de um dos palestrantes, Edgard Gouveia Júnior:
[É] arquiteto e urbanista, graduado na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo de Santos, SP, Brasil, 1993; pesquisador do Instituto TIBÁ – Tecnologia Intuitiva (?) e Bio-arquitetura (??), 1993-1996; pós-graduado em Jogos Cooperativos (???), Universidade Monte Serrat, 2003; professor da pós-graduação da Universidade Monte Serrat, 2004-2007 no curso Desenvolvendo Comumunidades; consultor e palestrante internacional nas áreas de protagonismo juvenil, empoderamento molecular e comunitário (????) e Jogos Cooperativos; facilitador do Projeto Cooperação; Co-fundador e Presidente o Instituto Elos – BR; membro da rede internacional Berkana Exchange, 2006-2007; Fellow Ashoka, 2006.O leitor mentalmente são começa a se perguntar uma série de perguntas, como por que diabos uma universidade em Santos se chama Monte Serrat, em que consistiria um curso chamado Desenvolvendo Comunidades, desde quando 'protagonismo juvenil' se transformou em área do conhecimento e outras tantas. E quanto à tecnologia intuitiva? O que significa isso? Só é tecnologia intuitiva a tecnologia que os estudantes forem capaz de intuir? E se os estudantes forem todos umas bestas?
Não parece razoável que toda uma geração se deixe levar por uma tergiversação de tão baixa qualidade. Se são esses os luminares que devem nos dizer o que fazer com nosso tempo, estaremos melhor dormindo.
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